segunda-feira, 27 de março de 2017

Livros com finais não tão felizes

Em várias conversas com amigas sobre literatura infantil surge o tema do “politicamente correto” e “finais felizes”.

- Chris, esse livro é racista, aquele é homofóbico, esse tem o final muito triste, aquele tem violência... – e por aí vai!

Sempre respondo a mesma coisa, e as respostas são perguntas:

- A intenção é fazer leitura mediada ou dar para criança ler sozinha?
- Após a leitura, há um bate-papo sobre a história ou vocês simplesmente devolvem o livro para a estante? - se essa é a opção, escolha muito bem os livros.

O ideal é ler junto com a criança e conversar depois sobre a história. Aproveitar para ensinar uma análise crítica, mostrar que nem sempre os livros estão certos, muito menos seus personagens. E quanto aos finais felizes, pasmem, na vida é assim, não há somente finais felizes. Vamos falar de livros assim?

Meu favorito: “Primeira Palavra” de Tino Freitas e Elvira Vigna, publicado pela Abacatte. O livro conta a história de uma criança de rua de 06 anos, analfabeta e que ama visitar um sebo de livros. Choca, né?! Foi a minha chance de dizer:

-Filhos, há crianças sem acesso à escola, abandonas nas ruas, sozinhas. Seria muito bom se todos tivéssemos escola, uma casa, uma família, não é? – e através dele meus filhos conheceram uma realidade muito diferente da deles e, partindo disso, desenvolver empatia por problemas que não os atinge tão diretamente.

No mesmo rumo, tem o maravilhoso “Papo de Sapato” de Pedro Bandeira e ilustrado por Ziraldo, editado pela Melhoramentos. Uau! Que dupla, hein? O livro conta a história de sapatos velhos que se encontram no lixão e que dividem as histórias maravilhosas de suas vidas. Com um final surpreendente, também muito adequado para falar de justiça social.

Da mesma coleção da Melhoramentos, indico “Ponto de vista” da maravilhosa Ana Maria Machado e também ilustrado pelo Ziraldo. Um livro incrível! Onde duas crianças vivem na mesma cidade, mas com realidades muito diferentes e tudo muda com o ponto de vista desses amigos mudam e tomam a mesma direção.

Tem também os que falam de morte, muito úteis, já que como disse Ariano Suassuna, é a inevitável, mais dia menos dia eles enfrentarão essa situação. “O avô de Arthurzinho tocava Moedroca” de Marcus Arthur editado pela Edebe e o “Menina Nina, duas razões para não chorar” do Ziraldo (olha ele aí de novo!).

Tem também o “Lino” de André Neves, da Editora Callis, que chegou aqui naquele projeto de um certo banco. O livro fala da separação, também inevitável. Quem nunca teve um amigo que se mudou de bairro, de cidade ou que seguiu outros rumos na vida? Esse livro é lindo! Daqueles de chorar. Não privem seus filhos dessas emoções tão lindas! Chorem juntos, se emocionem, se abracem, aproveitem e fortaleçam os vínculos.

Ah! Peraí! Tem também o da vingativa Toupeira que queria saber quem fez cocô na cabeça dela, já falei dele por aqui! (http://www.geracaomae.com.br/literatura-infantil/dicas-literarias-da-chris-da-pequena-toupeira-que-queria-saber-quem-tinha-feito-coco-na-cabeca-dela-e-‘o-pum) e ainda as histórias clássicas das princesas repletas de vaidades e machismo! Os contos originais de Charles Perrault e dos Irmãos Grimm são quase histórias de terror e um prato cheio para falar de tantas coisas que precisam ser apresentadas aos nossos filhos.

Impossível não falar do tão polêmico Monteiro Lobato, dito racista e com a Emília tão desaforada e grosseira? Adoro! Aproveito para falar da escravidão, do racismo, da estrutura da sociedade brasileira, empatia.

Finalizando, deixo para vocês uma frase do livro “A condenação da Emília, o politicamente correto na literatura infantil” do Ilan Brenman (o cara dos puns das princesas, lembram?) que diz “O politicamente correto, por mais paradoxal que pareça, é irmão da intolerância, primo da violência e sobrinho da burrice.”